sábado, 25 de abril de 2009

Questão de posse

Texto no blogue Os Salvadores Daqui

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Epopéia do irrisório: Paranã/São Francisco

De longe, na Integração, eles são todos um amontoado que se espreme por uma vaga sentado. Nunca tive uma exata compreensão sobre a raiz desse problema – se dá por falta de fila pra contratar funcionário ou por falta de funcionário pra arrumar fila? O fato é que com funcionário contratado, ou seja, teoricamente, com fila arrumada, perderia uma cena animalesca, com certeza digna de qualquer romance de Zola, e a pequena introdução desse raro texto em prosa.

Eu não seria o animal mais desnaturado a destoar todo aquele quadro. Não podia. O instinto de sobrevivência não deixava. Como a cena era mesmo animalesca, fui, então, um macho viril de alto porte e me utilizei de todos os truques que a natureza me dotou. Exalei odores, fiz caretas de intimidação, demarquei território e, ufa, consegui uma vaga sentado.

E que bela vaga sentado! – já digo porquê. Estando eu devidamente acomodado, era tempo de abandonar o vigor animal, diminuir a taxa de testosterona no sangue e voltar a ser um bom hommo sapiens sapiens. (Fora daquele amontoado se perde um tantão da sensação de anonimato que justifica o comportamento animal. Ademais, sentado, eu estava muito bem acompanhado.)

Agora vou ao porquê. E que bela companhia! Ela tinha um ar leve, ela sim, destoava toda a cena animalesca anteriormente descrita. Puro contraste com o universo ao redor. Exalava um odor verdadeiramente atraente e demarcava seu território com charme tamanho que até intimidava qualquer tentativa de aproximação. Tinha um tom de artificialidade dotado de tanta natureza que, novamente, me vi acometido por meus instintos. De maneira diferente.

Ela carregava um Vade Mecum no colo. A dedução óbvia: era estudante de Direito. (Um dado não tão relevante, e por isso deixo aqui registrado entre parênteses, é que com essa constatação, fui tomado pela curiosidade de saber qual instituição freqüentava tal criatura – a parada de ônibus que saltasse revelaria seu destino.) Eu também era estudante de direito. E era, principalmente, um macho tentando impressionar uma grande fêmea em potencial.

O Direito seria uma bela desculpa para ultrapassar o território demarcado com o charme da moça. Impressionar, é verdade, não podia, uma vez que o Vade Mecum dela me informava que seus conhecimentos eram superiores aos que eu ainda, porcamente, sorvia com meus livros de Introdução ao Estudo do Direito. Poderia, entretanto, me aproximar com uma prosa descompromissada sobre a ciência, sem ter que ir logo de cara me humilhando - mas uma hora, de fato, eu teria que fazê-lo. E eu, ainda, era um macho querendo impressionar. Não me restou outra saída, senão abortar a estratégia jurídica.

Havia - além do de Introdução ao Direito - dois outros livros na minha bolsa clichê de universitário, ambos muito bons, por sinal, mas o momentâneo objetivo era impressionar. Um deles era um Celso Furtado, bem pequenininho e de capa meio feia e que, talvez pelo próprio autor, não impressionasse a estudante de Direito. O outro era mais seguro, Nova Antologia Poética de Vinicius de Moraes, não era meu, mas era grande e de capa bonita. Perfeito para a ocasião!

Tirei da minha bolsa o Vinícius e cruzei as pernas. Ajeitei o cabelo, mexi nos meus 18 pêlos da barbicha, masquei um Trident e comecei a ler – tudo puro fingimento com muita cara de hommo sapiens sapiens. Vinícius estava lá, preso àquelas páginas e eu nem me esforçava pra compreender suas imagens sensuais. A cada três poemas olhava curiosamente prum anteparo de vidro à minha frente que refletia a reação da minha companheira de viagem. Depois da terceira espiadela a moça percebeu minha tentativa – fracassada – de impressionar e riu. Puxou a cordinha, rindo, e se foi. (A faculdade era particular). Depois que ela saiu, não pude ter diferente reação. Também ri, meio muito sem graça, mas ri.

E lembrando Vinícius, não aquele lido distraído nas paginas da Antologia, aproveito para dizer: Que me perdoe minha oficial, mas flertar no ônibus é fundamental. (Ela, (in)felizmente, não costuma passear de transporte coletivo).

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Noite fria e sem carimbó

Foi um dia longo -

daqueles entre compras no supermercado e batucadas
de samba.
Nada tão especial.

Foi um dia de chuva -
daqueles que levam a preces de perdão a São Pedro
                [ e fazem aflorar todos os rios aterrados da cidade ilha.
Nada tão inusitado.

É uma noite de vinho -
daquelas que me fazem pensar besteiras e besteiras d'Ela.
Um amigo sugere :
- Vai lá, escreve.

E cá estive. 
Hábil até onde o vinho permitiu.

domingo, 5 de abril de 2009

Vovó de férias no século XXI

Vovó me disse que esses tempos hiperpósmodernos andam tão virados -
E ela nem sabe o que
é ser
hiperpósmoderno.

Que diaxo que tudo hoje é canseira?!
Que diaxo que tudo hoje é câncer?!

- É hiperpósmodernia, Vó.

Que diaxo que carro anda engarrafado
e quem cuida de dente não sabe sorrir?!

- É tudo hiperpósmodernia, Vó.

Diaxo!

Eu sei, sei.
Em realidade, todo esse resmungo
não passa de
saudade.

- Vamos lá, Vó.

E desde quando o mundo não foi virado?
Talvez antes fosse só do
avesso.